"As ideias dominantes numa época nunca passaram
das ideias da classe dominante".
Karl Marx
Karl Marx
Em recente artigo publicado pela revista Veja (clique aqui) o articulista Gustavo Ioschpe faz duras críticas aos sindicatos que defendem as causas dos professores brasileiros. Ao dar início à leitura do artigo de Ioschpe muitos professores pelo Brasil afora devem ter ficado furiosos com as suas duras críticas aos professores e aos sindicatos que o representam. Pode parecer uma coisa sem sentido, mas o seu artigo se conecta ao artigo divulgado nessa semana pelo ex-presidente FHC (clique aqui). E por que esses dois artigos se conectam?
O artigo do ex-presidente FHC defende que a única esperança que ainda resta ao PSDB hoje para que ele consiga chegar ao poder é cooptar a nova classe média, segundo ele a oposição deveria desistir de conquistar as camadas mais pobres do eleitorado e se concentrar na "nova classe média" formada por pessoas com maior poder aquisitivo do que o povão, mas despolitizada. Vejamos um trecho do artigo " Enquanto o PSDB e seus aliados persistirem em disputar com o PT a influência sobre os movimentos sociais ou o povão, falarão sozinhos".
Pois bem, todos nós sabemos hoje, ou deveríamos saber, que a revista Veja (e isso inclui seus articulistas como Gustavo Ioschpe) virou um panfleto que defende as ideias da direita neoliberal que hoje tem seu apoio em partidos como o DEM (antigo PFL), o PSDB e agora o PSD de Kassab, inclusive financiando campanhas do PSDB, que depois de eleitos retribuem assinando a peso de ouro revistas do grupo Abril, tais como a própria Veja.
Mas onde está a relação mais direta entre o artigo de Ioschpe e o artigo de FHC? A resposta está na possível candidatura do ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves a presidência. Quem tem acompanhado a imprensa nos últimos meses tem percebido que o discurso de Aécio é de se aproximar dos sindicatos, e isso ficou bem claro na votação do mínimo de 600 reais defendido pelo PSDB na Câmara com o apoio dos sindicatos.
E qual é o título do artigo de Gustavo Ioschpe? Hora de peitar os sindicatos. Esse título não é por acaso, ele surge na esteira da crítica feita pelo sempre líder do PSDB Fernando Henrique Cardoso, de que o partido deve se afastar do povão e essa recomendação é voltada para Aécio Neves e sua provável candidatura em 2014 a Presidência da República.
Agora vamos a análise do artigo:
O primeiro ponto abordado por Ioschpe é uma comparação esdrúxula ao lobby praticado pelos grupos tabagistas e a atuação de um sindicato. Só por esse argumento já se percebe a fraqueza desse argumento inicial utilizado pelo autor;
O segundo ponto é que para dar um ar de artigo científico a sua análise (que é na verdade um artigo de opinião), Gustavo Ioschpe aborda diversos estudos realizados nos EUA como embasamento para suas ideias. Como já foi trabalhado ad nauseam por diversos autores acadêmicos como Stuart Schwartz em As Ideias Fora do Lugar, a realidade de um país ou de um determinado tema não pode, ou melhor não deve ser analisada pela realidade do outro, ou seja, a realidade educacional brasileira e a americana não guardam nenhuma semelhança entre si, seja pelo conteúdo estudado nas escolas ou seja, pela remuneração dos professores. Por isso, essa análise é por si só arbitrária. Mas como os erros não param por ai vejamos outros deslizes.
Segundo Ioschpe "Talvez seja por isso que os aumentos salariais tenham se provado ferramenta tão ineficaz na melhoria da qualidade da educação: as pessoas mais competentes parecem não fugir do magistério pelo fato de o salário ser alto ou baixo, mas sim por seu salário não ter nenhuma relação com seu desempenho. Nenhum ás quer trabalhar em lugar em que recebe o mesmo que os vagabundos e incompetentes. Talvez seja por isso que outro estudo mostrou, paradoxalmente, que a filiação a um sindicato afeta de forma significativamente negativa a satisfação dos professores com a sua profissão. É o preço a pagar pelo aumento salarial". Em nenhum momento o autor analisa a realidade brasileira, ele apenas analisa as conclusões tiradas pelos autores dos artigos (os americanos) e a partir dai como um ás ou melhor como um asno (não deu para evitar o trocadilho) ele conclui que o que desmotiva o professor jovem na carreira não é o salário baixo, mas sim o fato de que colegas incompetentes ganham o mesmo tanto do que ele ou mais. Isso não é verdade, todos nós sabemos que há pessoas competentes no meio educacional, mas há também aqueles que não levam a sério a sua profissão, mas em nenhum momento esse fator foi decisivo para a saída de profissionais da carreira do magistério, mesmo porque a última pesquisa do MEC apontou que apenas uma pequena parte do alunos (os piores) do final do Ensino Médio tem interesse de seguir carreira no magistério, ou seja, o problema é salarial, logo nenhum jovem brilhante trocaria uma carreira em um empresa pelos salários oferecidos nas redes públicas de educação.
Para concluir, no fim da década de 90, Gustavo Ioschpe, então recém-saído da adolescência, estreou como colunista do caderno Folhateen, suplemento para adolescentes do jornal Folha de S. Paulo. Em um dos seus artigos, sugeriu a cobrança de mensalidades nas universidades públicas do país. A partir daí, Gustavo Ioschpe passou a economista requisitado em seminários e palestras por todo Brasil, sobre educação um tema que ele profundamente não conhece (pois é um tecnocrata como tantos que habitam o ninho tucano), pois o problema da educação no Brasil passa pela questão salarial SIM e pela falta de uma política pública séria para educação. A educação não deve ser tratada apenas como questão de governo. O envolvimento de toda a sociedade é fundamental, para que a Educação seja uma prioridade não do governo, mas do Estado brasileiro, ou seja, do país, algo que infelizmente ainda não é.
Paulo Gustavo Grossi da Silva
Professor de História e Filosofia
Diretor de Comunicação
Sind-UTE Viçosa
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