quinta-feira, 23 de maio de 2013

Avelino Ganzer: “Democratizar a mídia é chave para combater a ditadura do grande capital”

Primeiro vice-presidente da CUT na década de 80 denuncia que “os grupos que controlam a mídia são os que concentram riqueza e poder”

“Os grupos que controlam a mídia são basicamente os mesmos que concentram riqueza e poder em articulação com o capitalismo internacional. Nesta batalha contra a dominação política e o controle da informação, democratizar a comunicação é chave para combater a ditadura do grande capital”.

A afirmação é de Avelino Ganzer, primeiro vice-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e grande liderança dos trabalhadores rurais na luta contra a ditadura, que participou nesta terça-feira (14) em Belém do Pará como painelista no Seminário de Planejamento da Central na região Norte. Atualmente chefe do escritório especial da Secretaria Geral da Presidência da República em Altamira, no Pará, aos 65 anos, o homem que sobreviveu a acidente aéreo e a um sem número de cercos e ameaças, traça paralelo entre os desafios dos movimentos sindical e social de ontem e hoje, sublinhando a relevância do seu protagonismo para alterar a correlação de forças na sociedade.

Nesta entrevista, o veterano dirigente faz um amplo resgate da cultura amazônida, fala das riquezas da região, condena a superexploração do meio ambiente e da mão de obra pelas transnacionais, e destaca o papel da consciência e da ação coletivas para defender o interesse da classe trabalhadora. “Sempre defendemos a necessidade de consolidar um grande time, com unidade na diversidade, para avançar até esgotar os limites da pauta comum”, ressaltou Avelino, lembrando a máxima de um velho militante de Pacajá: “governo é como galo velho, só fica bom na pressão”.

O que diferencia a Amazônia das demais regiões?

A Amazônia legal é uma região rural muito forte. Nossas cidades, mesmo capitais imensas como Manaus e Belém, têm uma relação muito estreita com a ruralidade, o que é diferente de dizer com a agricultura. Esta ruralidade é natureza, água, floresta, as riquezas naturais no solo e no subsolo, e as populações no seu contexto geral.

Há um componente indígena muito forte.

A população nativa nos estados mais antigos tem uma cultura indígena muito forte, mas que obviamente também encontram-se submetidas aos impactos do sistema capitalista. É uma população que não tem a relação com a propriedade; para ela, a terra não é uma mercadoria. Não há essa ideia de que a terra até aqui é minha e dali pra lá é tua. A forma violenta como se impõe o sistema capitalista fere de morte estas comunidades. Daí a necessidade de termos muito cuidado na demarcação de terras indígenas, pois essa é uma população sobrevivente. Para o capitalismo, que despreza todo o acúmulo desse processo social e cultural de convivência e espaços públicos, essas comunidades são um obstáculo a ser removido, um atraso à expansão da sua lógica. Se a escolaentrasse, se a ciência entrasse, se a grade curricular viesse a essas comunidades para impulsionar um sistema que respeitasse e mantivesse sua cultura, teríamos enfim desenvolvimento sustentável. Esse nó na Amazônia não está resolvido, assim como não está resolvida a questão dos quilombolas, da população negra que resistiu e continua resistindo.

A situação se complica ainda mais em função das imensas riquezas naturais de uma região que é alvo da cobiça internacional?

Claro que sim. Temos aqui vários dos minérios mais importantes do mundo: minério de ferro, bauxita (que produz alumínio), ouro, cobre, cassiterita, manganês, tudo em quantidade. No município de Itaituba, no alto do rio Tapajós, onde vão construir hidrelétricas, de 1974 até 1980, havia um aeroporto que era mais movimentado do que o de Cumbica, em São Paulo. Era um perigo de tanta aeronave que subia e descia com o ouro que saia clandestinamente para o Paraguai, para o Uruguai, países que não tinham ouro e viraram exportadores. Enquanto isso muita gente daqueles verdadeiros formigueiros humanos morria de malária, de disputa de vida ou morte na base da foice e de facão. Na região, muitas multinacionais que apoiaram a ditadura foram beneficiadas com grandes áreas de terra, milhares de hectares, da qual tiraram muita riqueza. Mesmo hoje há fazendas com 200 retroescavadeiras, com muito maquinário mesmo, sem a necessária fiscalização, devido à fragilidade do Estado.

Mas o Estado brasileiro, infelizmente, continua financiando a exportação de commodities ou produtos sem valor agregado.

Um dos exemplos disso é a hidrelétrica de Tucuruí, feita para fazer funcionar o complexo siderúrgico de Barcarena. Ali, depois de utilizarem a nossa energia, a bauxita vira lingotes de alumínio. A população subsidia há décadas esse beneficiamento primário. Se você olha a geração desta riqueza, onde é que ela vai gerar os melhores empregos, os melhores salários, não é na Amazônia. Aqui fica o trabalho desgraçado, os resíduos ambientais, os detritos, a poluição, o caos. Precisamos agir contra esta exploração predatória, que enriquece uns poucos que levam embora o que é nosso.

É uma realidade de saque invisibilizada pela grande mídia, pois seus anunciantes lucram com a manutenção desta lógica. Qual a sua avaliação sobre a campanha pela liberdade de expressão defendida pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e pela CUT?

Os grupos que controlam a mídia são basicamente os mesmos que concentram riqueza e poder em articulação com o capitalismo internacional. Nesta batalha contra a dominação política e o controle da informação, democratizar a comunicação é chave para combater a ditadura do grande capital. No meu entendimento é fundamental este esforço democratizante pela regulamentação do setor, que desperta o medo das elites. Essa mobilização pode resultar vitoriosa com uma campanha mais qualificada, de massa, que ganhe as ruas, o que não é fácil. Daí a necessidade, também, de azeitarmos os nossos próprios meios de comunicação, como o site da CUT e todos os demais instrumentos da Central e dos movimentos sociais que se articulam em favor da democracia.

Nas tuas falas sempre está presente a palavra unidade e, mais do que um recado aos mais jovens, soa como conclamação.

Sempre defendemos a necessidade de consolidar um grande time no sindicalismo, com unidade na diversidade, para avançar até esgotar os limites da pauta comum. Acho que devemos gastar mais energia no diálogo, procurando entender a diversidade, pois a falta de clareza nos fragiliza. É desta forma que compreendo a construção de uma nova hegemonia do campo democrático e popular, que precisa colocar sua pauta e ampliar a pressão, exercer sua independência e autonomia de qualquer governo. Encerro lembrando a máxima de um velho militante de Pacajá: “governo é como galo velho, só fica bom na pressão

Fonte: CUT – 14.05.13 - Leonardo Severo, de Belém-PA

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