Uma das principais características do capitalismo
é a transformação dos seres humanos em mercadorias e, principalmente, em
máquinas geradoras de riquezas a serem expropriadas pela classe dominante. Para
isso, busca ao máximo fragmentar um importante atributo do ser social: o
trabalho.
Separa-se o “pensar o trabalho” da tarefa em si,
processo esse intitulado de alienação do trabalho. O homem se transforma em um
ser autômato, desprovido de sua capacidade de compreender seu papel e, não
obstante, reconhecer o valor de seu trabalho e de se apropriá-lo. A alienação
do trabalho torna-se a base fundamental da exploração de uma classe sobre a
outra na sociedade moderna contemporânea.
Contudo, o capitalismo se desenvolveu de forma
desigual e combinada. A alienação se inseriu no mundo do trabalho em diversos
lugares de formas distintas. Mais profundo na produção industrial desde o
século XIX, mas dinâmico no mundo corporativo no século XX, mais dissimulado na
cultura e nas artes no século XXI. E nos últimos 20 anos acompanhamos uma forte
ofensiva da alienação do trabalho também no ambiente escolar.
Em meio às metamorfoses do capital, no qual se
busca novas formas de exploração de mais-valia e acumulo de riquezas – garantindo
assim a produção e reprodução do status quo –, o ideal capitalista tem
transformando tudo em mercadoria. A educação, ao lado da saúde, não escapou
dessa dinâmica. Seja por meio de sua mercantilização descarada (a proliferação
das escolas particulares e o fetiche por tal produto), seja também por meio da transformação
da educação pública em um instrumento de formatação de uma força-de-trabalho barata,
porém produtiva. Em meio a esse processo, percebemos o fenômeno da alienação do
trabalho no profissional docente.
O professor, antes visto como o agente principal
do processo de ensino-aprendizagem – ao lado do aluno –, vê seu papel social
diminuir diante das novas lógicas de mercado inserido no ambiente escolar. A
busca desenfreada pela produção de uma mercadoria (neste caso, o aluno futura
mão-de-obra) de forma mais rápida, mais barata e mais produtiva (e também mais
submissa) faz com que o professor passe por um verdadeiro processo de
alienação. Sob a desculpa da busca de uma “pseudo-qualidade” medida em números,
seu trabalho sofre uma brutal intervenção; o docente é obrigado, por meio de diversos
mecanismos, a abrir mão da elaboraçãoautônoma de suas aulas, e adotar conteúdos
e normas prontas, construídas por sujeitos externos ao ambiente no qual se dá a
educação. Em outros termos, o professor torna-se um simples cumpridor de
tarefas, um tarefeiro; uma máquina que tem como papel apenas apertar mais um
parafuso em uma cadeia produtiva.
O planejamento de uma aula é um importante (mas
não único) elemento na busca de uma educação de real qualidade e de real
interesse da população. No entanto, a elaboração desse planejamento deve ser
atribuição do professor, em conjunto com os seus colegas e a sua comunidade escolar,
respeitando a diversidade local, e aproveitando-se das experiências adquiridas
em sua formação e ao longo de sua carreira. Impor um modelo de planejamento, ou
a forma de como deve ser feito, tirando do professor a autonomia sobre as mesmas,
e obrigando-o a adotar uma educação enlatada, pronta – fast food –, é
contradizer o próprio conceito de educação como prática da liberdade.
Essa realidade demonstra a discrepância absurda
existente entre as ideias que permeiam a área da educação e a prática imposta
nas salas de aula. Ao mesmo tempo em que observamos a existência e a divulgação
de políticas educacionais e projetos político-pedagógicos que tem como mote a formação
do ser humano cidadão, atuante e protagonista na construção de sua própria
história social, essas mesmas políticas impõe modelos educacionais que buscam
cada vez mais a burocratização e a desumanização do ensino.
Nesse momento seria uma grande contradição
pedagógica o professor aceitar e se submeter a essa imposição. Como
profissionais da educação, como sujeitos detentores do papel social fundamental
para a conscientização da sociedade, torna-se seu dever resistir ao processo de
alienação de seu trabalho. No entanto, como outros aspectos da vida humana, as
ações de resistência e transformação devem se construir a partir do coletivo.
Professores, supervisores, diretores, funcionários,
alunos, pais, etc., debatam essa realidade em seu ambiente de trabalho, em suas
casas, nas rodas de amigos. Busquem coletivamente formas e ações de resistência
que possam impedir a destruição da educação pública de interesse social.
Somente a união e a mobilização podem nos instrumentalizar
para fazer frente a esses ataques, como também nos permitir alcançar as transformações
que tanto desejamos.
Cássio Diniz - Graduado em História pela
Universidade Salesiana de São Paulo, e mestre em Educação pela Universidade
Nove de Julho. É professor da rede pública estadual de Minas Gerais e foi
professor-convidado na Unisalesiano/Lins. Atualmente é diretor estadual do
Sind-UTE/MG.
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